Trump pressiona por cortes de juros e reacende temor de “domínio fiscal” nos EUA
Dívida acima de 120% do PIB e críticas ao Fed colocam independência do banco central em xeque enquanto investidores já precificam inflação maior e dólar mais fraco

O aumento da dívida pública dos Estados Unidos e as pressões do presidente Donald Trump para que o Federal Reserve reduza os juros trouxeram de volta ao mercado o risco de “domínio fiscal”. Nesse cenário, a prioridade de manter o financiamento do governo barato se sobrepõe à missão de controlar a inflação.
Um orçamento aprovado pelo Congresso, de maioria republicana, adicionará trilhões à dívida, ampliando o custo do serviço público. Trump defende cortes agressivos, argumentando que uma redução de três pontos percentuais na taxa básica, hoje entre 4,25% e 4,50%, poderia economizar até US$ 1 trilhão por ano.
A pressão política revive lembranças da década de 1940, quando o Fed foi forçado a manter juros baixos para financiar a Segunda Guerra Mundial. O resultado foi um surto inflacionário que só terminou com o acordo de 1951, que devolveu autonomia ao banco central. Atualmente, analistas afirmam que sinais semelhantes já se refletem nos mercados: rendimentos de longo prazo seguem elevados e o dólar acumula queda de cerca de 10% em 2025.
“O governo quer reduzir a dívida, mas a outra forma de lidar com ela é inflacionando seu valor real”, disse Kelly Kowalski, da MassMutual. Para Nate Thooft, da Manulife, a busca por taxas mais baixas expõe a dificuldade de sustentar a atual carga de endividamento sem riscos de maior volatilidade inflacionária.
O presidente do Fed, Jerome Powell, afirma que a política monetária não leva em conta a gestão da dívida. Ainda assim, investidores enxergam risco crescente à independência do banco central. O Deutsche Bank destacou que déficits elevados e juros longos próximos ao crescimento nominal do PIB já funcionam como sinais de alerta.
Historicamente, episódios de domínio fiscal extremo resultaram em crises severas, como a hiperinflação alemã nos anos 1920 e a turbulência cambial recente da Turquia. Nos EUA, a dívida já supera 120% do PIB, proporção maior que no período pós-guerra. “O Fed não consegue controlar a inflação e manter os juros da dívida baixos ao mesmo tempo. Essas duas coisas estão em conflito”, avaliou Eric Leeper, professor da Universidade de Virgínia.
Apesar das críticas abertas da Casa Branca, Powell reafirmou que cumprirá seu mandato até 2026. O mercado acompanha cada movimento, já que a reunião do Fed em setembro deve indicar se a pressão política se converterá em cortes de juros ou se a autoridade monetária resistirá para preservar sua credibilidade histórica.